Equinócio de Primavera (originário da lista Recons-IberoCeltica)
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Equinócio de Primavera (originário da lista Recons-IberoCeltica)
Da autoria de M. Diniz Nemetios
(Quarta-Feira, 22 de Setembro de 2010)
Saudações!
Aproximando-se a festividade, decidi compartilhar aqui também de uma "inovação" que planejei para a ocasião. Ainda faltam alguns preparativos, mas já musiquei o hino à Nábia que postei aqui e assim que registrá-lo numa gravação decente, eu posto.
-Nós aqui celebraremos a festividade honrando deuses Callaecos, em especial o aspecto caçadora/nympha da deusa Nábia e o deus Véstio (entendendo-o como um deus jovem, ligado ao fogo e ao sol). Para os que a observarão sob um prisma focalmente lusitano, sugiro o foco na deusa Atégina.
E qual é a inovação? Não é difícil.
-Na negra anterior a celebração (no caso, nesta passada), colhe-se um bastão, preferencialmente já seco.
-No amanhecer do dia da cerimônia, colhe-se (com os devidos procedimentos) um bastão vistoso - ainda vivo.
-Antes da cerimônia os dois bastões são enfeitados, o primeiro com fitas e cores escuras; o segundo com cores e fitas coloridas e vivas. Após os enfeites, os bastões são nomeados solenemente ("batizados", digamos), o primeiro de Giamocinos (pronuncia-se: /guiamoknos/ - significa "filho do inverno") e o segundo de Samocinos (/samoknos/, "filho do verão").
-Após a invocação principal à deusa ligada a renovação vegetal/florescimento e antes do sacrifício principal aos deuses da ocasião, é tirado a sorte entre dois participantes do rito, a posse dos bastões. Depois, o restante dos participantes improvisam (pelo menos será nosso caso) um música cantando em círculo enquanto os dois realizam uma dança (provavelmente, também improvisada - pode ser simulando um combate, como dos pauliteiros mirandeses) ao centro. Num determinado momento do "combate", uma participante (uma virgem, talvez) adentra o recinto com uma flor e amarra-a no bastão Samocinos. Daí em diante o "certame" continua de modo que o bastão Giamocinos, cai - quando isto ocorrer, o canto e a dança cessam.
-Giamocinos é preparado e oferecido como parte das oferendas principais (no nosso caso, para o deus Véstio).
-Samocinos é ornado com flores, e todos dançam e cantam balançando-o; após isto é posto junto ao altar. Depois guardado (poderia ser mantido vivo numa água ou plantado), ou posto para exercer alguma função para o grupo ou alguém do grupo até o próximo equinócio (o de outono).
Considerações
*O simbolismo é muito evidente e jaz, em última instância, num modelo Indo-Europeu antiquíssimo. Na grande maioria todo o mundo IE, tais festividades são acompanhadas de danças circulares e cantos que envolvem, giros e balanços (algumas muitas vezes realizado apenas por jovens adolescentes ou virgens, segurando algum símbolo solar ou relativo ao renascimento da vegetação) vd. WEST, M. L. Indo-European Poetry and Myth. Oxford/New York: Oxford University Press, 2007. p. 213-214.
*Em termos de UPG, poderiam ser os bastões, um de carvalho outro de azevinho - caso haja na região.
*O bastão Samocinos, poderia ser novamente enfeitado (ou mesmo sacrificado - estou estudando esta possibilidade) no Belotenes.
*Este modelo foi adaptado à bio-região local (muitas plantas aqui já estão começando a floração, as do hemisfério norte mesmo plantadas aqui, florescem nesta época) - o período entre o Beltane e o Soltício de Verão é extremamente quente e o Sol deixa de ser "benéfico" para assumir seu aspecto mais temeroso aos nordestinos.
Por favor, fiquem a vontade para sugestões, críticas ou comentários.
Inté!
:nemetios:
:pb:
(Quarta-Feira, 22 de Setembro de 2010)
Saudações!
Aproximando-se a festividade, decidi compartilhar aqui também de uma "inovação" que planejei para a ocasião. Ainda faltam alguns preparativos, mas já musiquei o hino à Nábia que postei aqui e assim que registrá-lo numa gravação decente, eu posto.
-Nós aqui celebraremos a festividade honrando deuses Callaecos, em especial o aspecto caçadora/nympha da deusa Nábia e o deus Véstio (entendendo-o como um deus jovem, ligado ao fogo e ao sol). Para os que a observarão sob um prisma focalmente lusitano, sugiro o foco na deusa Atégina.
E qual é a inovação? Não é difícil.
-Na negra anterior a celebração (no caso, nesta passada), colhe-se um bastão, preferencialmente já seco.
-No amanhecer do dia da cerimônia, colhe-se (com os devidos procedimentos) um bastão vistoso - ainda vivo.
-Antes da cerimônia os dois bastões são enfeitados, o primeiro com fitas e cores escuras; o segundo com cores e fitas coloridas e vivas. Após os enfeites, os bastões são nomeados solenemente ("batizados", digamos), o primeiro de Giamocinos (pronuncia-se: /guiamoknos/ - significa "filho do inverno") e o segundo de Samocinos (/samoknos/, "filho do verão").
-Após a invocação principal à deusa ligada a renovação vegetal/florescimento e antes do sacrifício principal aos deuses da ocasião, é tirado a sorte entre dois participantes do rito, a posse dos bastões. Depois, o restante dos participantes improvisam (pelo menos será nosso caso) um música cantando em círculo enquanto os dois realizam uma dança (provavelmente, também improvisada - pode ser simulando um combate, como dos pauliteiros mirandeses) ao centro. Num determinado momento do "combate", uma participante (uma virgem, talvez) adentra o recinto com uma flor e amarra-a no bastão Samocinos. Daí em diante o "certame" continua de modo que o bastão Giamocinos, cai - quando isto ocorrer, o canto e a dança cessam.
-Giamocinos é preparado e oferecido como parte das oferendas principais (no nosso caso, para o deus Véstio).
-Samocinos é ornado com flores, e todos dançam e cantam balançando-o; após isto é posto junto ao altar. Depois guardado (poderia ser mantido vivo numa água ou plantado), ou posto para exercer alguma função para o grupo ou alguém do grupo até o próximo equinócio (o de outono).
Considerações
*O simbolismo é muito evidente e jaz, em última instância, num modelo Indo-Europeu antiquíssimo. Na grande maioria todo o mundo IE, tais festividades são acompanhadas de danças circulares e cantos que envolvem, giros e balanços (algumas muitas vezes realizado apenas por jovens adolescentes ou virgens, segurando algum símbolo solar ou relativo ao renascimento da vegetação) vd. WEST, M. L. Indo-European Poetry and Myth. Oxford/New York: Oxford University Press, 2007. p. 213-214.
*Em termos de UPG, poderiam ser os bastões, um de carvalho outro de azevinho - caso haja na região.
*O bastão Samocinos, poderia ser novamente enfeitado (ou mesmo sacrificado - estou estudando esta possibilidade) no Belotenes.
*Este modelo foi adaptado à bio-região local (muitas plantas aqui já estão começando a floração, as do hemisfério norte mesmo plantadas aqui, florescem nesta época) - o período entre o Beltane e o Soltício de Verão é extremamente quente e o Sol deixa de ser "benéfico" para assumir seu aspecto mais temeroso aos nordestinos.
Por favor, fiquem a vontade para sugestões, críticas ou comentários.
Inté!
:nemetios:
:pb:
Ara de Marecos e o Equinócio Vernal
Base para o rito de Primavera, o registro de Marecos:
O(ptimae V(irgini) CO(ornigerae uel conservatrici) ET NIM(phae) DANIGO
M NABIAE CORONAE VA
CA(m) BOVEM NABIAE AGNV(m)
IOVI AGNVM BOVE(m) LA
CT(endem)
[...]VRGO AGNVM LIDAE COR(nigerae uel cornutae uel coronam)
ANN(o) ET DOM(o) ACTVM V APR(ilis) LA
RGO ET MESALLINO CO(n)S(ulibus) CURATOR(ibus)
LUCRETIO VITULINO LUCRETIO SAB
INO POSTVMO PEREGRINO
Optimae Virgini Conservatrici et Nymphae *Danigōm*, Nabiae Coronae uacam bouem(-que), Nabiae agnum, Ioui agnum bouem lactendem(-que) … urgo¹ agnum, Lidae coronam. Anno et domo actum · V aprilis · Largo et Messalino consulibus; curatoribus: Lucretio Vitulino, Lucretio Sabino, Postumo Peregrino.
“à Ótima Virgem Conservatriz e Ninfa dos Danigos, Návia Coroa, uma vacam e um boi, a Návia um cordeiro, a Jove um cordeiro e um vitelo (“boi de mama”) … urgo¹ um cordeiro, a Lida uma coroa. Ato [de sacrifício] para o ano e domicílio (ou “santuário”) · V abril · pelos cônsules Largus e Messalinus; curadores: Lucretius Vitulinus, Lucretius Sabinus, Postumus Peregrinus.”
*Danigōm: assumo que aqui seja um genitivo plural de tema em -o em galaico, ou seja “dos Danigos” ou então uma contração do genitivo plural latino DANIGO(ru)M > “Danigorum”.
¹ … urgo: é um teônimo em dativo singular, e ao que tudo indica um apenas atestado nesta inscrição, como é o caso da deusa Lida. A questão é: poder-se-ia reconstruir o nome da divindade em ocasião? Com 100% de certeza, obviamente, que não. Mas pode-se especular algo como o seguinte: qual a letra inicial? Em Proto-Céltico, temos as raízes prováveis: *lorgo- “1. traço, rastro, sinal, pista; 2. vara, pau, bastão”; *gorgo- “grosseiro, rude, áspero, rugoso” e *yurko- “gamo, corça”, ou menos provavelmente *φorko- “porco” ou *turko-/torko- “javali”. Apesar das últimas palavras serem mais interessantes, não há muita evidência para crer que *-rk- > **-rg-; de modo que muito provavelmente (MESMO), o -RG- reflita, de fato, um *-rg-. Se termos em conta uma certa tendência do *-or- > **-ur- antes de dental e gutural (TVRANVS/TVRANI > *torano- “trovão”, TVRCVLAE > *torko-ulā > *turkūlā > “javalizinha”), que não é algo definido, ficamos com *gorgo- e *lorgo-. Neste caso, o nome do deus seria **Gurgos** (pelo nome, um deus ligado a rudeza, força e talvez ao pastoril, talvez uma divindade ligada a proteção dos rebanhos) ou **Lurgos** (me parece que também associado ao pastoreio e força, aos caminhos, trilhas e proteção ou fertilidade).
Evidências gerais:
·O rito fora realizado ao início de abril (mais provavelmente em 5 dos idos, ou seja 9 de Abril; ou no próprio 5, já que não há referência inequívoca aos idos, que seria chamado das “nonas”), após o Equinócio de Primavera, inserindo-se nas celebrações romanas ligadas a Tellus (Tellus Mater, Gaia), as Fornicidia (que ocorriam em 15 de Abril e contava com o sacrifício de vacas prenhes e envolvia a presença das Vestais) e a Cerealia em 19 de Abril. Portanto, em celebrações de caráter pastoral, agrário, de proteção e renovação, para asseguramento da fertilidade dos campos, sementes, plantio e animais.
·As vítimas são: 3 cordeiros, 1 vaca e um 1 boi, 1 bezerro de mama e 1 coroa (de flores, guirlanda)
·Primeiro são ofertados aos grandes deuses Nabia Triforme e a Jove, depois a (?)urgo e a Lida.
·Ao que sugere, o rito é anual e deve ser entendido como uma cerimônia sazonal
Justificações gerais:
·Não sabemos se a data fora sempre esta, ou adaptada para aproximar-se de festivais romanos; ainda, pode estar relacionada ao ciclo de pastoreio/plantação local, ou ainda ao ciclo lunar das imediações do Equinócio de Primavera.
·O caráter sazonal da festividade sugere que esta seja adaptada aos ciclos sazonais locais, no Hemisfério Sul portanto, a festa estaria ligada ao mês de Setembro ou começo de Outubro. Daí que se pode assumir algum critério para delimitar a data no Hemisfério Sul: i. transferência do dia – ou seja, de 9 de Abril para 9 de Outubro; ii. Identificar a fase da lua no ano (foram cônsules C. Prastina Messalinus & L. Annius Largus no 147e.c.) e adaptar, neste caso tendo Coimbra como referência de latitude, no dia 9 de Abril de 147e.c. A lua estava minguante – ou seja, a primeira minguante após o equinócio de primavera (graças ao programas Stellarium e KStars); iii. Aproximar de uma data geral próxima onde, de acordo como o calendário Neopagão, se celebra uma festa de caráter similar, neste caso o Equinócio de Primavera. Assumirei esta última opção como forma geral de ressignificação da data do Equinócio Vernal de um ponto de vista biorregional.
·Podemos tomar o caráter geral do rito de duas fontes básicas “próximas”: a Fornicidia romana e/ou os ritos de Primavera germânicos. No geral, em relação ao mundo céltico, é de se esperar numa data destas algo da simbologia do Imbolc e algo da do Beltane.
Divindades da ocasião:
A Ara de Marecos se encontra na região do panteão da Galécia Bracarense.
·Návia triforme (Návia ninfa, Návia dos exércitos e da soberania [as duas parecem haver sido ligadas à Diana], e a deusa Návia em seu aspecto mais geral)
·Jove, o deus-céu supremo, neste caso muito provavelmente, Reu (Rēus)
·Lurgo/Gurgo? ...urgo – divindade de provável caráter pastoril, ligada a força bruta
·Lida – deusa cujo nome é desenvolvimento exato da deusa Indo-europeia *Plith2-wih2 (“plenitude, planura”) > *Φlitā > Lidā, cujo nome significa “estendida, espalhada” sendo o nome para a Terra em gaulês Litauī < *Φlitāwyā < *Plith2-wih2 (DELAMARRE, 2003. p. 204).
De um ponto de vista Indo-europeu, no rito são homenageados grandes divindades.
*Priheh2/*Deh2nu- (?)
*Deywos
*Welnos/*Ph2euson- (?)
*Plith2wih2
Esboços sobre a metafísica básica do rito:
·Em termos Indo-europeus: na grande maioria todo o mundo IE, tais festividades são acompanhadas de danças circulares e cantos que envolvem, giros e balanços (algumas muitas vezes realizado apenas por jovens adolescentes ou virgens, segurando algum símbolo solar ou relativo ao renascimento da vegetação) vd. WEST, M. L. Indo-European Poetry and Myth. Oxford/New York: Oxford University Press, 2007. p. 213-214.
·Pela Fornicidia: uma oferenda “limiar/mediúnica”. (viva mas não nascida, não completamente formada mas sacrificada, não na terra nem no ar) o bezerro não nascido na vaca prenhe, é retirado adequadamente (com as preces e maneiras corretas) e depositado numa pira junto com a vaca por sacerdotes “puros” (Vestais), e as cinzas são preservadas para serem misturadas com o sangue seco do sacrifício do October Equus, formando um composto (“suffimen” um tipo de “incenso” específico para purificação defumatória) que é espalhado no campo de forma a fortalecer/propiciar o embrião (grão/semente, etc.) no ventre de Tellus Mater de modo a ser bem gerado. Tal sacrifício fora dito em sonho pelo deus Faunus ao rei sabino Numa, quando este questiona o deus por um modo de ultrapassar as dificuldades agrícolas/aridez das terras, o deus respondeu: morte boum tibi, rex, Tellus placanda duarum: / det sacris animas una iuvenca duas (Ovídio, Fasti. 4.641-666), ou seja “com a morte de um boi para ti, rei, Tellus havendo de ser aplacada de duas: dê para os ritos duas almas por uma novilha”.
·Pelas celebrações germânicas: temos a relação com o festival em honra de deusa Ostara, celebrado nos finais de março e começo de abril, envolvendo o sol nascente (e acendimento de fogueiras neste momento, com danças de fertilidade circulares em sentido horário), as águas retiradas das fontes neste dia tem caráter bento, as virgens devem vestir-se de branco, há o costume da pintura dos ovos e a associação com lebres e há relatos de danças com uma espada. No mungo escandinavo há ainda o Dísablót, festa em prol das Dísir (designação geral para entidades femininas, que incluem as Nornas e Valquírias) onde os sacrifícios eram levados a cabo por sacerdotisas em prol das colheitas futuras, ocorriam feiras na ocasião também.
·Folclore português: festa do catolicismo popular de S. Bento (21 de Março onde se roga para não faltar pão e as moças pedem bons maridos) e a procissão do Cuco, São Pedro Gonçalves (ambas festas ligadas a pássaros, fitas coloridas, música e caráter solar) e S. Marcos (esta última ligada a bênçãos de bezerros contra doenças e lobos e ao abrandamento dos “valentões”). No primeiro de Abril havia festas do tipo Entrudo, onde era comum “guerras” de água de cheiro, perfumes, legumes e água em geral. Há ainda o costume da Serração da Velha (pela metade da festa cristã da Quaresma) – quando rapazes se reúnem com instrumentos musicais para “caçoar” de um dado idoso da vila, até que este se enfureça e coloque todos para correr – partindo os jovens para outro paradeiro.
·Práticas modernas neopagãs diversas: representação da luta do velho inverno com o jovem do verão, subida da deusa da fertilidade ao mundo vinda do submundo. Algumas das práticas como a “Serração da Velha” ou mesmo de guerras d'água do tipo Entrudo é possível apenas com um número considerável de pessoas.
·Propósito geral do rito: assegurar a fertilidade do grão plantado em geral e nascimento suficiente dos pastos, para a fertilidade geral do local e manutenção/renovação das forças fertilizadoras da terra para a sobrevivência do mundo humano (que depende do mundo animal e vegetal).
Vestes e detalhes:
-Uso de guirlandas, tranças e flores silvestres no cabelo
-Jovem não casada e sem filhos/virgem vestindo branco
-Uso de flores, fitas e símbolos solares
-É tradicional uma fogueira
O rito:
·Proponho duas formas básicas, a título de sugestão:
I. *Giyamo-knos Samo-knos'kwe
·Basicamente é representada um luta entre o Inverno e Verão, sendo que o Verão vence e o Inverno é mandado ao Submundo como vítima sacrificial para a fertilização dos campos comunitários e dos projetos dos participantes.
>prepara-se 2 bastões, um velho e outro colhido na véspera do rito enfeitando-os com fitas coloridas (o velho com cores mais opacas e escuras), os bastões são levados para o rito.
>após as devidas preparações começa-se o rito explicando o significado e expondo os bastões – um (o velho) representando o Inverno passado, sendo “batizado” de *Giyamo-knos (“ivernógeno” - nascido do Inverno) e o outro (o novo) representando o Verão vindouro, sendo nomeado de *Samo-knos (“veranógeno” - filho d Verão). Dois participantes tiram a sorte e simulam um combate ao som de música improvisada. Numa dada parada, uma virgem ou mulher mais jovem adentra o recinto da peleja portando rosas e enfeita o bastão *Samo-knos, voltando este a luta e vencendo o certame improvisado.
>*Giyamo-knos é preparado pela jovem/virgem como parte das oferendas principais a ser queimado na pira; *Samo-knos é adornado com mais fitas, é cantado uma invocação ao deus da ocasião associado a fertilização e é realizado uma dança ao redor do bastão, sendo este colocado junto ao altar (e posteriormente guardado – para o próximo Equinócio).
>É realizado as invocações aos demais deuses da ocasião e sacrificado na ordem tradicional, cantado hinos e realizado demais homenagens.
II.
·Basicamente o rito consiste num sacrifício e preparação de um “catalizador” para fertilização geral.
>A vítima principal é trazida e devidamente purificada, enquanto entoa-se cantos e hinos invocatórios. O sacrifício é realizado por uma jovem/virgem sendo queimado.
>Os demais sacrifícios e homenagens (pode-se incluir uma dança com espada ou dança circular) são realizados.
>Parte das cinzas da oferenda principal (que já possam ser retiradas) são retiradas e misturadas cerimonialmente pelos oficiantes com um pouco da bebida ritual (pode ser como algo das “Águas da Vida”) que ao fim é aspergida ao redor e caso algum participante deseje, é permitido levar algo para casa para uso pessoal.
O(ptimae V(irgini) CO(ornigerae uel conservatrici) ET NIM(phae) DANIGO
M NABIAE CORONAE VA
CA(m) BOVEM NABIAE AGNV(m)
IOVI AGNVM BOVE(m) LA
CT(endem)
[...]VRGO AGNVM LIDAE COR(nigerae uel cornutae uel coronam)
ANN(o) ET DOM(o) ACTVM V APR(ilis) LA
RGO ET MESALLINO CO(n)S(ulibus) CURATOR(ibus)
LUCRETIO VITULINO LUCRETIO SAB
INO POSTVMO PEREGRINO
Optimae Virgini Conservatrici et Nymphae *Danigōm*, Nabiae Coronae uacam bouem(-que), Nabiae agnum, Ioui agnum bouem lactendem(-que) … urgo¹ agnum, Lidae coronam. Anno et domo actum · V aprilis · Largo et Messalino consulibus; curatoribus: Lucretio Vitulino, Lucretio Sabino, Postumo Peregrino.
“à Ótima Virgem Conservatriz e Ninfa dos Danigos, Návia Coroa, uma vacam e um boi, a Návia um cordeiro, a Jove um cordeiro e um vitelo (“boi de mama”) … urgo¹ um cordeiro, a Lida uma coroa. Ato [de sacrifício] para o ano e domicílio (ou “santuário”) · V abril · pelos cônsules Largus e Messalinus; curadores: Lucretius Vitulinus, Lucretius Sabinus, Postumus Peregrinus.”
*Danigōm: assumo que aqui seja um genitivo plural de tema em -o em galaico, ou seja “dos Danigos” ou então uma contração do genitivo plural latino DANIGO(ru)M > “Danigorum”.
¹ … urgo: é um teônimo em dativo singular, e ao que tudo indica um apenas atestado nesta inscrição, como é o caso da deusa Lida. A questão é: poder-se-ia reconstruir o nome da divindade em ocasião? Com 100% de certeza, obviamente, que não. Mas pode-se especular algo como o seguinte: qual a letra inicial? Em Proto-Céltico, temos as raízes prováveis: *lorgo- “1. traço, rastro, sinal, pista; 2. vara, pau, bastão”; *gorgo- “grosseiro, rude, áspero, rugoso” e *yurko- “gamo, corça”, ou menos provavelmente *φorko- “porco” ou *turko-/torko- “javali”. Apesar das últimas palavras serem mais interessantes, não há muita evidência para crer que *-rk- > **-rg-; de modo que muito provavelmente (MESMO), o -RG- reflita, de fato, um *-rg-. Se termos em conta uma certa tendência do *-or- > **-ur- antes de dental e gutural (TVRANVS/TVRANI > *torano- “trovão”, TVRCVLAE > *torko-ulā > *turkūlā > “javalizinha”), que não é algo definido, ficamos com *gorgo- e *lorgo-. Neste caso, o nome do deus seria **Gurgos** (pelo nome, um deus ligado a rudeza, força e talvez ao pastoril, talvez uma divindade ligada a proteção dos rebanhos) ou **Lurgos** (me parece que também associado ao pastoreio e força, aos caminhos, trilhas e proteção ou fertilidade).
Evidências gerais:
·O rito fora realizado ao início de abril (mais provavelmente em 5 dos idos, ou seja 9 de Abril; ou no próprio 5, já que não há referência inequívoca aos idos, que seria chamado das “nonas”), após o Equinócio de Primavera, inserindo-se nas celebrações romanas ligadas a Tellus (Tellus Mater, Gaia), as Fornicidia (que ocorriam em 15 de Abril e contava com o sacrifício de vacas prenhes e envolvia a presença das Vestais) e a Cerealia em 19 de Abril. Portanto, em celebrações de caráter pastoral, agrário, de proteção e renovação, para asseguramento da fertilidade dos campos, sementes, plantio e animais.
·As vítimas são: 3 cordeiros, 1 vaca e um 1 boi, 1 bezerro de mama e 1 coroa (de flores, guirlanda)
·Primeiro são ofertados aos grandes deuses Nabia Triforme e a Jove, depois a (?)urgo e a Lida.
·Ao que sugere, o rito é anual e deve ser entendido como uma cerimônia sazonal
Justificações gerais:
·Não sabemos se a data fora sempre esta, ou adaptada para aproximar-se de festivais romanos; ainda, pode estar relacionada ao ciclo de pastoreio/plantação local, ou ainda ao ciclo lunar das imediações do Equinócio de Primavera.
·O caráter sazonal da festividade sugere que esta seja adaptada aos ciclos sazonais locais, no Hemisfério Sul portanto, a festa estaria ligada ao mês de Setembro ou começo de Outubro. Daí que se pode assumir algum critério para delimitar a data no Hemisfério Sul: i. transferência do dia – ou seja, de 9 de Abril para 9 de Outubro; ii. Identificar a fase da lua no ano (foram cônsules C. Prastina Messalinus & L. Annius Largus no 147e.c.) e adaptar, neste caso tendo Coimbra como referência de latitude, no dia 9 de Abril de 147e.c. A lua estava minguante – ou seja, a primeira minguante após o equinócio de primavera (graças ao programas Stellarium e KStars); iii. Aproximar de uma data geral próxima onde, de acordo como o calendário Neopagão, se celebra uma festa de caráter similar, neste caso o Equinócio de Primavera. Assumirei esta última opção como forma geral de ressignificação da data do Equinócio Vernal de um ponto de vista biorregional.
·Podemos tomar o caráter geral do rito de duas fontes básicas “próximas”: a Fornicidia romana e/ou os ritos de Primavera germânicos. No geral, em relação ao mundo céltico, é de se esperar numa data destas algo da simbologia do Imbolc e algo da do Beltane.
Divindades da ocasião:
A Ara de Marecos se encontra na região do panteão da Galécia Bracarense.
·Návia triforme (Návia ninfa, Návia dos exércitos e da soberania [as duas parecem haver sido ligadas à Diana], e a deusa Návia em seu aspecto mais geral)
·Jove, o deus-céu supremo, neste caso muito provavelmente, Reu (Rēus)
·Lurgo/Gurgo? ...urgo – divindade de provável caráter pastoril, ligada a força bruta
·Lida – deusa cujo nome é desenvolvimento exato da deusa Indo-europeia *Plith2-wih2 (“plenitude, planura”) > *Φlitā > Lidā, cujo nome significa “estendida, espalhada” sendo o nome para a Terra em gaulês Litauī < *Φlitāwyā < *Plith2-wih2 (DELAMARRE, 2003. p. 204).
De um ponto de vista Indo-europeu, no rito são homenageados grandes divindades.
*Priheh2/*Deh2nu- (?)
*Deywos
*Welnos/*Ph2euson- (?)
*Plith2wih2
Esboços sobre a metafísica básica do rito:
·Em termos Indo-europeus: na grande maioria todo o mundo IE, tais festividades são acompanhadas de danças circulares e cantos que envolvem, giros e balanços (algumas muitas vezes realizado apenas por jovens adolescentes ou virgens, segurando algum símbolo solar ou relativo ao renascimento da vegetação) vd. WEST, M. L. Indo-European Poetry and Myth. Oxford/New York: Oxford University Press, 2007. p. 213-214.
·Pela Fornicidia: uma oferenda “limiar/mediúnica”. (viva mas não nascida, não completamente formada mas sacrificada, não na terra nem no ar) o bezerro não nascido na vaca prenhe, é retirado adequadamente (com as preces e maneiras corretas) e depositado numa pira junto com a vaca por sacerdotes “puros” (Vestais), e as cinzas são preservadas para serem misturadas com o sangue seco do sacrifício do October Equus, formando um composto (“suffimen” um tipo de “incenso” específico para purificação defumatória) que é espalhado no campo de forma a fortalecer/propiciar o embrião (grão/semente, etc.) no ventre de Tellus Mater de modo a ser bem gerado. Tal sacrifício fora dito em sonho pelo deus Faunus ao rei sabino Numa, quando este questiona o deus por um modo de ultrapassar as dificuldades agrícolas/aridez das terras, o deus respondeu: morte boum tibi, rex, Tellus placanda duarum: / det sacris animas una iuvenca duas (Ovídio, Fasti. 4.641-666), ou seja “com a morte de um boi para ti, rei, Tellus havendo de ser aplacada de duas: dê para os ritos duas almas por uma novilha”.
·Pelas celebrações germânicas: temos a relação com o festival em honra de deusa Ostara, celebrado nos finais de março e começo de abril, envolvendo o sol nascente (e acendimento de fogueiras neste momento, com danças de fertilidade circulares em sentido horário), as águas retiradas das fontes neste dia tem caráter bento, as virgens devem vestir-se de branco, há o costume da pintura dos ovos e a associação com lebres e há relatos de danças com uma espada. No mungo escandinavo há ainda o Dísablót, festa em prol das Dísir (designação geral para entidades femininas, que incluem as Nornas e Valquírias) onde os sacrifícios eram levados a cabo por sacerdotisas em prol das colheitas futuras, ocorriam feiras na ocasião também.
·Folclore português: festa do catolicismo popular de S. Bento (21 de Março onde se roga para não faltar pão e as moças pedem bons maridos) e a procissão do Cuco, São Pedro Gonçalves (ambas festas ligadas a pássaros, fitas coloridas, música e caráter solar) e S. Marcos (esta última ligada a bênçãos de bezerros contra doenças e lobos e ao abrandamento dos “valentões”). No primeiro de Abril havia festas do tipo Entrudo, onde era comum “guerras” de água de cheiro, perfumes, legumes e água em geral. Há ainda o costume da Serração da Velha (pela metade da festa cristã da Quaresma) – quando rapazes se reúnem com instrumentos musicais para “caçoar” de um dado idoso da vila, até que este se enfureça e coloque todos para correr – partindo os jovens para outro paradeiro.
·Práticas modernas neopagãs diversas: representação da luta do velho inverno com o jovem do verão, subida da deusa da fertilidade ao mundo vinda do submundo. Algumas das práticas como a “Serração da Velha” ou mesmo de guerras d'água do tipo Entrudo é possível apenas com um número considerável de pessoas.
·Propósito geral do rito: assegurar a fertilidade do grão plantado em geral e nascimento suficiente dos pastos, para a fertilidade geral do local e manutenção/renovação das forças fertilizadoras da terra para a sobrevivência do mundo humano (que depende do mundo animal e vegetal).
Vestes e detalhes:
-Uso de guirlandas, tranças e flores silvestres no cabelo
-Jovem não casada e sem filhos/virgem vestindo branco
-Uso de flores, fitas e símbolos solares
-É tradicional uma fogueira
O rito:
·Proponho duas formas básicas, a título de sugestão:
I. *Giyamo-knos Samo-knos'kwe
·Basicamente é representada um luta entre o Inverno e Verão, sendo que o Verão vence e o Inverno é mandado ao Submundo como vítima sacrificial para a fertilização dos campos comunitários e dos projetos dos participantes.
>prepara-se 2 bastões, um velho e outro colhido na véspera do rito enfeitando-os com fitas coloridas (o velho com cores mais opacas e escuras), os bastões são levados para o rito.
>após as devidas preparações começa-se o rito explicando o significado e expondo os bastões – um (o velho) representando o Inverno passado, sendo “batizado” de *Giyamo-knos (“ivernógeno” - nascido do Inverno) e o outro (o novo) representando o Verão vindouro, sendo nomeado de *Samo-knos (“veranógeno” - filho d Verão). Dois participantes tiram a sorte e simulam um combate ao som de música improvisada. Numa dada parada, uma virgem ou mulher mais jovem adentra o recinto da peleja portando rosas e enfeita o bastão *Samo-knos, voltando este a luta e vencendo o certame improvisado.
>*Giyamo-knos é preparado pela jovem/virgem como parte das oferendas principais a ser queimado na pira; *Samo-knos é adornado com mais fitas, é cantado uma invocação ao deus da ocasião associado a fertilização e é realizado uma dança ao redor do bastão, sendo este colocado junto ao altar (e posteriormente guardado – para o próximo Equinócio).
>É realizado as invocações aos demais deuses da ocasião e sacrificado na ordem tradicional, cantado hinos e realizado demais homenagens.
II.
·Basicamente o rito consiste num sacrifício e preparação de um “catalizador” para fertilização geral.
>A vítima principal é trazida e devidamente purificada, enquanto entoa-se cantos e hinos invocatórios. O sacrifício é realizado por uma jovem/virgem sendo queimado.
>Os demais sacrifícios e homenagens (pode-se incluir uma dança com espada ou dança circular) são realizados.
>Parte das cinzas da oferenda principal (que já possam ser retiradas) são retiradas e misturadas cerimonialmente pelos oficiantes com um pouco da bebida ritual (pode ser como algo das “Águas da Vida”) que ao fim é aspergida ao redor e caso algum participante deseje, é permitido levar algo para casa para uso pessoal.
Sugestões? Críticas? Dúvidas? Por favor, posta-as!
Um ótimo Equinócio para todos!
Bem, celebramos hoje, as fotos estão no blog do grupo. A princípio tivemos uma constatação chata - o pequeno santuário na colina foi violado e teve várias pedras removidas... mas conseguimos contornar a situação e tivemos um ótimo rito. Finalmente estão sepultadas as desgraças deste inverno em particular e os deuses nos mostraram belas e grandes coisas.
Inté!
Inté!
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